Durante um passeio pela vibrante cidade de Salvador, é impossível não se deparar com a rica história e a forte presença das mulheres negras que moldaram, e continuam a moldar, o Brasil. O rolê intitulado “Heroínas Negras” é uma jornada transformadora que convida os visitantes a conhecer a memória, a resistência e o legado das mulheres que, ao longo dos séculos, resistiram e lutaram pela liberdade, dignidade e respeito, não apenas na Bahia, mas em todo o território nacional.
Este roteiro faz parte do Rolê Afro, uma iniciativa que oferece uma série de 11 rotas focadas nas experiências afrocentradas de Salvador. Nesse sentido, a presença negra feminina destaca-se como um elemento central, evidenciando as contribuições significativas de figuras icônicas, bem como a resiliência comunitária que persiste até hoje.
Monumento Maria Felipa
O passeio começa na Praça Maria Felipa, onde se encontra um monumento em homenagem a essa heroína da Ilha de Itaparica. Maria Felipa é lembrada por seu papel crucial na Independência da Bahia, ao liderar ações significativas contra o exército português em 1823. A relevância de sua história vai além do apaixonado ativismo, pois destaca o protagonismo feminino negro em momentos decisivos da história brasileira.
A obra criada por Nadia Taquary simboliza a luta pela reconhecimento da presença negra na formação da cidade e do país, tornando-se um ponto de reflexão sobre a construção da identidade brasileira. O manifesto artístico do monumento ecoa a necessidade de ressignificação dos espaços urbanos, fomentando uma nova visão sobre a história local. Desta forma, a praça se torna um ponto de partida para um questionamento mais amplo sobre a narrativa histórica que ainda precisa ser desvelada.
Memorial das Baianas de Acarajé
A próxima parada é o Memorial das Baianas de Acarajé, um espaço que celebra a trajetória e o reconhecimento das mulheres que, com suas iguarias, mantém viva a cultura afro-brasileira. O acarajé, mais que um prato típico, é um símbolo de resistência e de luta pela afirmação da identidade cultural das mulheres negras.
As baianas, herdeiras das “ganhadeiras” que, em tempos de escravidão, comercializavam na rua para conquistar autonomia, foram fundamentais para a construção da economia e da cultura local. O espaço exibe não apenas a gastronomia, mas também as histórias de superação e proatividade dessas mulheres, suas práticas empreendedoras e o legado que perpetuam ao longo das gerações.
Em 2004, a atividade das baianas foi tombada como Patrimônio Cultural Imaterial pelo IPHAN, um reconhecimento que exalta a importância de suas contribuições, criando uma nova narrativa sobre a relação entre gênero, raça e economia em Salvador. O memorial serve não apenas para celebrar, mas também para educar e conscientizar sobre a rica tradição culinária da Bahia.
Museu Nacional de Enfermagem
O roteiro segue até o Museu Nacional de Enfermagem, um espaço que rende homenagem a Anna Nery, uma baiana que se destacou como pioneira na profissionalização da enfermagem no Brasil. O museu revela o papel essencial das mulheres negras na transformação da saúde e do cuidado, mostrando como suas contribuições foram fundamentais para moldar a prática da enfermagem no país.
Uma das figuras mais significativas abordadas no museu é a Iyalorixá Mãe Stella de Oxóssi. Mãe Stella não foi apenas uma enfermeira respeitada, mas também uma escritora e líder religiosa de destaque. Seu legado é notável, pois ela lutou pela valorização das religiões de matriz africana e pela promoção do respeito à diversidade cultural.
A visita ao museu não só apresenta a história da enfermagem, mas também abre portas para debates sobre a diversidade, o respeito à cultura negra e a importância da inclusão social na saúde pública. Mãe Stella simboliza a convergência de saberes e práticas que fortalece a identidade afro-brasileira, ao passo que sua trajetória nos inspira a lutar por um sistema de saúde mais justo e equitativo.
Rua Alaíde do Feijão
O próximo ponto do passeio é a Rua Alaíde do Feijão, que homenageia a cozinheira e líder comunitária Alaíde da Conceição. Nascida em 1948, ela se destacou não apenas por sua habilidade culinária, mas como uma figura central na articulação política do movimento negro em Salvador, especialmente durante os anos 1990.
O restaurante fundado por Alaíde se tornou um espaço de resistência, de troca de saberes e, acima de tudo, um ponto de encontro. Sua luta em defesa da liberdade religiosa e da cultura afro-brasileira ressoou em muitas vozes, e seu legado permanece vivo através de sua família e da continuidade de seu trabalho. Alaíde representa a força da mulher negra em um contexto onde suas contribuições foram muitas vezes invisibilizadas.
Instituto A Mulherada e Afoxé Filhas de Gandhy
O rolê culmina na experiência musical promovida pelo Instituto A Mulherada e pelo Afoxé Filhas de Gandhy. Nesse espaço, as participantes podem vivenciar a potência de mulheres instrumentistas que revestem a cidade com ritmos vibrantes e empoderadores. As duas organizações atuam em múltiplos fronts: promovem a cultura afro-brasileira, inspiram a luta pelos direitos das mulheres e atuam contra a violência de gênero.
O Afoxé Filhas de Gandhy, por exemplo, é uma expressão cultural que presta homenagem ao orixá Gandhy e é um dos mais representativos da cena musical baiana. Sua relevância vai muito além da música; o grupo desenvolve ações sociais que buscam promover a igualdade e garantir o acesso das mulheres ao mercado de trabalho.
A conexão entre a música e a luta por direitos é uma linha tênue, mas intrínseca no caminho das mulheres negras na Bahia. A junção de arte e ativismo ilumina a necessidade de se reconhecer a história por trás das vozes que se levantam em celebração e protesto.
Serviço do Rolê Afro: Heroínas Negras
O rolê tem duração estimada de três horas, com disponibilidade diária e recomendações de horário a partir das 13h. O ponto de encontro é o Monumento Maria Felipa, e o passeio inclui visitas a todos os pontos mencionados. Essa experiência guiada é um convite para um mergulho na memória e na resistência. Vale ressaltar que a dificuldade é leve, mas não acessível para cadeirantes atualmente.
Saiba mais sobre o projeto
O Rolê Afro é uma iniciativa do Plano de Desenvolvimento do Afroturismo da Prefeitura de Salvador, com apoio de diversos consórcios e o intuito de promover o turismo afrocentrado. O projeto é pioneiro e tem como missão garantir que a cultura africana e afro-brasileira seja celebrada e respeitada.
O Comitê de Afroturismo, estabelecido em 2024, inclui profissionais de agências e empreendedores que visam ajudar na construção de políticas públicas focadas na valorização e promoção da cultura afro-brasileira.
A riqueza cultural e histórica das mulheres negras é um tema que precisa ser constantemente abordado e reverberado, e o Rolê Afro: “Heroínas Negras” possibilita essa reflexão de maneira envolvente e educativa.
Perguntas frequentes
Qual o objetivo do Rolê Afro: “Heroínas Negras”?
O objetivo é celebrar e reconhecer a história das mulheres negras que contribuíram significativamente para a formação cultural da cidade e do país.
Como posso participar do passeio?
O passeio é realizado diariamente, com duração estimada de três horas. O ponto de encontro é o Monumento Maria Felipa, e é necessário agendar previamente.
O que eu vou aprender durante o passeio?
Os participantes aprenderão sobre a história das heroínas negras, sua contribuição à cultura, economia e sociedade, além de conhecer locais simbólicos de Salvador.
O passeio é acessível para cadeirantes?
Atualmente, o nível de dificuldade é leve, mas não é acessível a cadeirantes.
Como a cultura afro-brasileira é promovida durante o evento?
Através de experiências musicais, oficinas de culinária e debates que destacam a importância da cultura afro-brasileira, além de reconhecer o legado das figuras históricas.
Qual o impacto da iniciativa na comunidade?
O Rolê Afro não apenas promove o turismo, mas também visa trazer à tona histórias que muitas vezes foram esquecidas, ajudando a comunidade a se reconhecer em sua própria história.
Conclusão
O Rolê Afro: “Heroínas Negras” não é apenas um passeio; é uma jornada transformadora que nos convida a revisitar a memória coletiva do Brasil sob a perspectiva do protagonismo feminino negro. Além de celebrar e reconhecer as contribuições dessas mulheres, o rolê estimula reflexões sobre identidade, resistência e a necessidade de valorização da cultura afro-brasileira. Ao participar desse evento, cada um de nós se torna parte de uma narrativa que enriquece e promove a diversidade e a igualdade na sociedade. Essa experiência é, sem dúvida, um convite à reflexão e à ação, reafirmando a importância do legado deixado por essas heroínas.
